Alvo de discussão entre fãs, o comercial da Volkswagen, veiculado em 2023, que recriou, com uso de Inteligência Artificial (IA), Elis Regina para cantar a música “Como os nossos pais” em um dueto com a filha Maria Rita, acendeu o debate sobre o impacto das novas tecnologias e ferramentas digitais no setor da economia criativa e os desafios regulatórios, no que se refere a direitos autorais e propriedade intelectual. O assunto foi tema de dois painéis promovidos pelo E-Cria, evento de economia criativa e inovação realizado em Londrina, no Espaço Villa Rica, nesta quinta-feira (6).
O painel “Economia criativa e direitos autorais: mercados e desafios regulatórios” foi conduzido pela advogada especializada em propriedade intelectual e inovação e membro da Comissão de Direito Autoral e Entretenimento da OAB-Londrina, Mariana Moreti, no período da manhã. Ela aponta que o mundo atual é volátil e tem passado por mudanças rápidas, especialmente no que diz respeito a novas tecnologias, e o Direito não dá conta de acompanhar e dizer o que é certo ou errado, por isso a necessidade de regulação.
“Não podemos frear a inovação e o desenvolvimento tecnológico, mas temos que olhar para trás e ver quem está perdendo. Quando falo de direito autoral, olhamos para toda a cadeia criativa, já que a IA está criando vídeos, imagens, dublagens”, comenta.
Ela argumenta que, para desenvolver esses projetos no audiovisual, por exemplo, as ferramentas de IA precisam ter sido treinadas e isso é feito por meio de uma base de dados que é fruto de trabalho de autores protegidos por direitos autorais. Por isso, esse “treinamento” precisa ser autorizado e ter uma base de dados transparente, segundo a advogada.
“Hoje, está em trâmite um projeto de lei para regulamentar a IA e a questão dos direitos autorais. As reflexões trazidas nos painéis são no sentido de contribuir para essa regulamentação, olhar para a inovação e, ao mesmo tempo, para a cadeia criativa”, afirma Mariana.
O advogado especialista em propriedade intelectual e mestre em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), Lucas Balconi, diz que, para as pessoas, de maneira geral, a IA possibilita ter acesso a novas formas de produção de conteúdo audiovisual. Em contrapartida, há um impacto negativo no mercado de trabalho para profissionais criativos.
“Se, antes, era necessário pagar criadores e técnicos para desenvolver um design, melhorar uma edição, trabalhar numa pós-produção, hoje, é possível fazer tudo isso através de plataformas de IA generativa”, argumenta.
Para falar sobre “Economia Criativa e Direito: desafios na era da inteligência artificial”, a docente, pesquisadora e coordenadora do Laboratório de Inovação Jurídica da PUC-PR Câmpus Londrina, Patricia Eliane da Rosa Sardeto, trouxe para o debate os reflexos das inovações tecnológicas na área jurídica e como os profissionais do Direito podem apoiar o setor de economia criativa, especialmente nas questões relacionadas a direitos autorais e propriedade intelectual.
“A gente vislumbra, especialmente por conta da inteligência artificial, a necessidade de um debate amplo e de profissionais que possam atuar nessa área também. Além da regulação, a própria Lei de Direitos Autorais, que é de 1998, talvez precise ser atualizada”, pontua a professora.
Setor deve movimentar R$ 24 mi, em Londrina
O audiovisual é apenas uma, e talvez a mais conhecida, entre as categorias enquadradas no setor de economia criativa, que também abrange as empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), artesanato, moda, publicidade, editorial, artes cênicas, artes visuais, arquitetura, design e música. Mas, para se ter uma ideia, apenas o mercado de audiovisual deve movimentar, entre 2024 e parte de 2025, cerca de R$ 24 milhões, um volume de recursos considerado histórico para Londrina.
Os números são de um levantamento realizado pelo LAVi, a Governança do setor de Audiovisual de Londrina, que levam em conta a captação de dinheiro do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), da Lei Paulo Gustavo (LPG), do Programa Municipal de Incentivo à Cultura (Promic) e também da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB). O presidente do LAVi, Eddie Mansan, lembra que a cidade possui um catálogo de bens e produtos audiovisuais que estão no circuito nacional e internacional.
Segundo Mansan, o primeiro E-Cria teve como objetivo, além de promover discussões relevantes para o setor, fazer conexões entre empresários, investidores e entidades. Ele lembra que a cultura tem uma dimensão econômica, social e simbólica, que impacta positivamente em outros setores produtivos.
“É um momento de a gente se colocar, se reafirmar, conversar com o empresariado e destacar esse potencial de negócio inovador que a cultura traz aqui para Londrina”, ressalta.
A consultora do Sebrae/PR, Leda Terabe, destaca a importância do evento para fomentar o debate sobre o setor, que é bastante abrangente. Ela destaca que, só no mercado audiovisual, são cerca de 4 mil empresas em Londrina, a maioria de pequeno porte. O E-Cria trouxe para discussão temas relevantes para os profissionais da área, pautados na inovação, que passaram pelos desafios impostos pela era da IA, mas também pelas maneiras de captar recursos e gerar riqueza para a região, pelo universo dos games e da animação.
“A criatividade vai ser o diferencial daqui para frente, para a sustentabilidade de qualquer cidade ou ambiente quando pensamos em desenvolvimento”, revela Leda.
A programação também contemplou uma rodada de negócios, com foco em networking, que contou com a participação de 70 pessoas, entre produtores de audiovisual, roteiristas, designers, editores, representantes da música e da dança. O objetivo foi favorecer conexões, troca de experiências e oportunidades de parcerias.
Realização
O E-Cria foi realizado pelo LAVi, PUC-PR Câmpus Londrina e Sebrae/PR, com o apoio da Agência Araucária de Ciência, Tecnologia e Inovação do Paraná, Governo do Estado do Paraná, Espaço Villa Rica e Ecossistema de Inovação Estação 43.